Igor Kamenev
CINZELAÇÃO
E quando o tempo terminar de esculpir meu corpo,
Com seus martelos pesados e seus cinzéis afiados,
Dele tirando todo o excesso de vaidades e matérias,
E do corpo, enxuto de músculos e pecados, minh’alma se apartar,
Espero ser compreendido pelas dores que, sem querer, causei
E ser admirado pelas dores que sofri na calada de meu viver.
Se é que o juízo final é mesmo uma balança imparcial,
E minhas cinzas puderem ser divididas em duas partes e um peso só,
Então que uma porção seja jogada no inferno e a outra no paraíso.
Que eu possa, finalmente, descansar em paz.
Oswaldo Antônio Begiato
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Igor Kamenev
PÉTALAS PLENAS
Leve meu peso leve
No teu cair descuidado
E me deixes vulnerável.
Serei, a ti, eternamente grata
Por teres chovido pedra
Nas minhas pétalas.
Pode agora a luz me atravessar sem dor.
Sou, sem ser efêmera, fêmea incólume.
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Igor Kamenev
ALTIVEZ
Depois de percorrer
meus pensamentos confusos,
rebentado e escasso,
termino de escrever
a poesia nova,
rebento indócil
que me rasga todo dia.
Olho pra ela e dela rio. Sem muita razão.
E quando vou repousar
deixando-a no livro aberto
de quem a lê sem sofrimentos
com os olhos gordos,
ela livre e de ninguém,
fica toda cheia de zombas.
Olha para mim e de mim ri também. Com razão.
Deixamos assim
os pratos da balança
no mesmo nível. E o fiel com ciúmes.
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Igor Kamenev
BLEFES
Não consigo gostar
desse jogo de baralho
onde abundam
sotas de ouro,
valetes de paus,
e blefes insólitos.
Enquanto ás de espadas
eles se acomodaram
dentro de uma cesta,
na hora da sesta,
sexta passada.
Macambúzio e rei de copas,
vou me mandar
para São José dos Ausentes
onde o frio é intenso,
o amor também
e não tenho parentes.
E que me tragam
uma jovem virgem
(ela chegará virgem
e virgem partirá)
para me aquecer,
dentro de uma cesta,
na hora da sesta,
sexta que vem,
feito Davi, o rei,
na sua velhice.
Não quero mais chorar de frio.
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Igor Kamenev
VISITA PURPÚREA
Por aqui, hoje, o sol se fez visita
E meus olhos angustiados se encantaram.
Fiquei com alma de cidade grande
E esperanças de porto pequeno.
O mar sem medidas e limites se abriu miúdo
Deixando-me agigantado e entorpecido
Diante de um horizonte colorido de batom
A abraçar-me em arrebatamentos espantosos.
Pude tocá-lo suavemente com mãos brancas,
Em sua ara depositar ofertas vermelhiças,
Experimentando a ternura, rebento milagroso
Da vida que acontece a cada ínfimo olhar.
O homem mal feito, impregnado de vícios,
Se viu criança com pincéis de luzes coloridas
E uma imensa tela bordada, feita de céu,
Brincando distraído no quintal do Universo.
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Igor Kamenev
SEGREDO DE POLICHINELO
Frágil, tenho medo de que revele
O segredo que lhe deixei
Guardado dentro de nosso beijo.
Quebro-me fácil dentro de sua boca;
Meus pedaços lhe entrego, sem defesas.
No meio deles, os ruídos;
Nos ruídos, a sintonia;
Na sintonia, as semibreves,
Nas semibreves, as sílabas;
Nas sílabas, as conjunções;
Nas conjunções, minha carne;
Na carne, o beijo irreversível;
No beijo, o segredo que lhe deixei.
Frágil, tenho medo de que o revele.
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Igor Kamenev
SACIAMENTO E PAZ
Vulcão ativo que és, com teu inesgotável amor
Explodindo no cume das nossas existências,
Ejaculas larvas de dentro de tua medula;
Larvas que o fogo das lavas não matou.
Elas lavram o campo de nossas esperanças;
Transmutam-se em borboletas coesas,
Lavam nossos ventres impuros e estéreis
E, sem dor, nos engravidam de trigo e trégua.
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Igor Kamenev
IMPERFEITO SONETO DO AMOR MADURO
Vim aqui fazer uma visita breve
Mas trouxe, no estribo da boca, o verbo,
Porque viver mesmo, sem dizer “eu te amo”,
Ninguém vive. Ninguém sobrevive. Ninguém.
Não quero que a fascinação te cegue,
Nem quero o despojamento te calando,
Quero-te com os ouvidos soltos aos sons
E o coração leviano, manso e entregue.
Assim poderei dizer: - Te amo! Sem medos,
Com todas as palavras expostas pela dor
E que o silêncio escondeu de mim e de ti.
Que minha vida continue sempre assim
Jamais precisando te perdoar nada,
Mas sempre precisando te pedir perdão.
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Igor Kamenev
FUNERAL
Derramem sobre minha pele
um jarro de perfume suave
e esperem a noite chegar.
Durante a noite enfeitem
o meu corpo com tintas claras;
o leito de morte
com as flores mais meninas,
fecundadas em afetuosos toques
pelo vento brejeiro,
cuja gentileza se fez semeadura
por entre meus cabelos
e cuja brandura,
obrigação cotidiana nossa,
amantes que fomos.
Deitem minha carne na jangada.
Estarei então pronto. Ateiem-me fogo.
Aquecido partirei
nos curtos braços do amor.
Com meu corpo em chamas
descerei a correnteza do rio até me consumar.
Oswaldo Antônio Begiato
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Igor Kamenev
PEDIDOS À LUZ DE VELAS
Quando ainda sonhador crédulo, de pernas nuas,
Disseram-me para não revelar os pedidos feitos
Por ocasião do sopro sobre velas do bolo de aniversário.
Nunca tive bolo de aniversário. Tive sempre fantasias.
A cada novo outubro imaginava um bolo, velas cheias de esperanças
E meu sopro sobre elas derramando desejos inocentes.
Nunca, nesse tempo todo, os revelei a quem quer que fosse.
Mesmo assim, teimosamente, eles, os pedidos, nunca se realizaram.
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Igor Kamenev
Igor Kamenev
Em frente a seu computador, Igor Kamenev parece estar frente a um cavalete. Ele adora trabalhar na internet. A seu lado, um cavalete de verdade, pincéis e muita tinta, telas e espátulas, e pinturas inacabadas esperando sua vez. Pela janela de seu estúdio, que é também sua casa, pode-se ver a igreja favorita de Polenov, além das residências em Old Arbat. A famosa "Spaso-House" fica bem dobrando a esquina. Agora, é a residência do embaixador Americano, mas em outros tempos já foi um lugar onde Margarita, uma personagem do livro de Bulgakov, terminava seu vôo em uma vassoura.
- Você pode ficar indiferente a esta rua, principalmente se você é um artista? - Igor Kamenev inicia a conversa. – O Arbat é Monmartre em estilo Moscou. Sonhei por muito tempo em ter um apartamento aqui, mas só me mudei faz pouco tempo. Minha mãe viveu aqui até 1937 e você certamente entende porque ela precisou se mudar.
Muitos de seus parentes passaram pelo GULAG. Dmitriy Dudko, avô do artista, não foi exceção. O próprio Igor, em sua juventude, sofreu pressão do regime, que nos tempos de Brezhnev assumiu vários disfarces: Igor Kamenev foi enviado por três vezes a hospitais de tratamento mental contra atividades dissidentes e por falar abertamente contra a arte oficial.
O nome do artista de vinte anos tornou-se famoso. Seu auto-retrato, que retrata uma pessoa cuja boca está tapada e os olhos pintados em vermelho, tornou-se símbolo do estado de espírito da União Soviética nos anos 70. A censura seguia cada passo seu e o artista só conseguia permissão para exibir seus trabalhos sob pressão da opinião pública, que não poderia ser ignorada pela polícia política de Brezhnev: os casos de Solzhenitsin e Sakharov já eram mais do que suficientes para eles. Em 1975 o Departamento de Estado americano enviou ao artista um convite para que se mudasse para os Estados Unidos. – Sem dúvida, fiquei lisongeado pela oferta, - relembra Kamenev, - mas eu não estava planejando viver nos States. Meus amigos e eu sempre desejamos trabalhar em nosso próprio país e acreditávamos em sua renascence. Como se pode ver, nós estávamos certos. E depois de tudo, não existe lugar melhor que o Arbat.
- Você pode ficar indiferente a esta rua, principalmente se você é um artista? - Igor Kamenev inicia a conversa. – O Arbat é Monmartre em estilo Moscou. Sonhei por muito tempo em ter um apartamento aqui, mas só me mudei faz pouco tempo. Minha mãe viveu aqui até 1937 e você certamente entende porque ela precisou se mudar.
Muitos de seus parentes passaram pelo GULAG. Dmitriy Dudko, avô do artista, não foi exceção. O próprio Igor, em sua juventude, sofreu pressão do regime, que nos tempos de Brezhnev assumiu vários disfarces: Igor Kamenev foi enviado por três vezes a hospitais de tratamento mental contra atividades dissidentes e por falar abertamente contra a arte oficial.
O nome do artista de vinte anos tornou-se famoso. Seu auto-retrato, que retrata uma pessoa cuja boca está tapada e os olhos pintados em vermelho, tornou-se símbolo do estado de espírito da União Soviética nos anos 70. A censura seguia cada passo seu e o artista só conseguia permissão para exibir seus trabalhos sob pressão da opinião pública, que não poderia ser ignorada pela polícia política de Brezhnev: os casos de Solzhenitsin e Sakharov já eram mais do que suficientes para eles. Em 1975 o Departamento de Estado americano enviou ao artista um convite para que se mudasse para os Estados Unidos. – Sem dúvida, fiquei lisongeado pela oferta, - relembra Kamenev, - mas eu não estava planejando viver nos States. Meus amigos e eu sempre desejamos trabalhar em nosso próprio país e acreditávamos em sua renascence. Como se pode ver, nós estávamos certos. E depois de tudo, não existe lugar melhor que o Arbat.
PEQUENA BIOGRAFIA
“SEM SOMBRAS
Ao meio dia
De um domingo
Prenhe de sol
E enamorado de outubro
Rompi espontâneo
Como um botão de rosa fêmea
Que nasce sem ser esperado.”
Nasci, sob o signo de escorpião,
em 26 de outubro do ano de 1.953,
na cidade de Mombuca,
um pequeno encanto
no canto interior
do Estado de São Paulo.
Menor que a cidade só eu mesmo.
Ainda pequeno vim para Jundiaí,
também São Paulo, Terra da Uva,
da qual experimentei o sabor do fruto
e jamais a deixei.
Nela me fiz advogado sem banca,
aposentado sem queixas
e onde perambulo até hoje,
buscando, perdidas nas sarjetas,
as palavras que me usam
para escrever poesias as quais publico aqui
e na internet de um modo geral,
além de ter participado com elas
de algumas Antologias pelo Brasil.
Em 1988, publiquei um livro de poesias,
sem muita importância e feito artesanalmente
em um mimeógrafo antigo,
chamado "O Menino".
Oswaldo Antônio Begiato
BLOG
www.oabegiato-poesias.blogspot.com
RECANTO DAS LETRAS
http://recantodasletras.uol.com.br/autores/oabegiato
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