Adela Leibowitz








Poema de Amor


Ser a atmosfera
que respiras,
conter-te em mim
como numa redoma,
entrar-te pelo olfato,
assim como as aspiras
invisíveis, do aroma...

Ser teu ambiente,
ser teu espaço circundante,
sentindo em mim roçar,
constantemente,
teu gesto palpitante...

Ser o silêncio
em que te enfurnas,
guardar teus
lentos pensamentos,
pelas horas noturnas...

Ser o teu sono,
sentir-te assim
como ninguém te sente
- abandonado
completamente
completamente esquecido
em mim...

Oh! meu prazer!
- sentir-te
e penetrar-te;
- em toda hora,
em toda parte,
gozar teu ser!
Sem que
o pudesses perceber;
- ser por ti absorvida;
- encher com minha vida
a tua vida


Gilka Machado


Adela Leibowitz





Insone



Noite feia. Estou só. Do meu leito no abrigo
cai a luz amarela e doentia do luar;
tediosa os olhos fecho, a ver, se assim consigo,
por momentos sequer o sono conciliar.


Da janela transponho o entreaberto postigo
entra um perfume humano impelido pelo ar...
"És tu meu casto Amor? és tu meu doce amigo,
que a minha solidão agora vens povoar?

A insônia me alucina; ando num passo incerto:
"és tu que vens... és tu!-
Reconheço este odor..."
Corro à porta, escancaro-a: acho a Treva e o Deserto.

E este aroma que é teu, aspirando, suponho
que a essência da tua alma, ó meu divino amor!
para mim se exalou no transporte de um sonho.

Gilka Machado




Adela Leibowitz





Olhando Minha Vida



Errei... Minha esperança, além,
se esfuma...
Sinto-me envelhecer...
A Terra é linda!
Mas a existência, aos poucos
se me finda, sem que eu tenha
gozado coisa alguma!

Sou produto de um erro; há
tanto vinda é a dor que no meu
peito se avoluma, que eu não
sei se a adquiri ou se ela, numa
lei atávica, em mim perdura ainda

Errei caminho, vim ao mundo à toa,
em vão minha alma libertar procuro
do peso que carrega e que a magoa

Minha existência é toda, toda errada
e, distendendo o olhar para o Futuro,
olho, perscruto, chamo, indago...-
Nada...

Gilka Machado


Adela Leibowitz






FRUSTRAÇÃO



Amei o Amor, ansiei o Amor, sonhei-o
uma vez, outra vez (sonhos insanos!)...
e desespero haja maior não creio
que o da esperança dos primeiros anos.

Guardo nas mãos, nos lábios, guardo em meio
do meu silêncio, aquém de olhos profanos,
carícias virgens para quem não veio
e não virá saber dos meus arcanos.

Desilusão tristíssima de cada
momento, infausta e imerecida sorte,
de ansiar o amor e nunca ser amada!

Meu beijo intenso e meu abraço forte,
com que pesar penetrareis o Nada,
levando tanta vida para a morte!...

Gilka Machado


Adela Leibowitz





Olhos Nuns Olhos



De onde vêm,
aonde vão teus olhos,
criança,
tão cansados assim
de caminhar?
Dessa tua existência
nova e mansa
como pode provir
um tal pesar?

A alma de fantasia
não se cansa!
Nunca existiu tristeza
nesse olhar;
é que a minha mortal
desesperança te olha
e nos olhos teus
vai-se espelhar

Com toda a vista
em tua vista presa,
penso:
uma dor
tão dolorosa assim
só há na minha
interna profundeza...


Não me olhes mais,
formoso querubim!
que vejo nos teus olhos
a tristeza
dos meus olhos
olhando pra mim

Gilka Machado