Giorgio De Chirico

Giorgio De Chirico






Sem saia, sem cera, censura


É a rima, a rima ditada por lei, por decreto
É a múmia que mama no feto
É a luz que se filtra nas grutas
O insosso temperando as frutas
O medo, o medo tem que censurar para criar
A parceria da pedra com a vidraça
Do elefante com a graça, com a taça
A parceria da bala de canhão, canhão, canhão
Com a bolinha de sabão.
A censura, ela gosta da arte
Mas é a Medusa retocando a musa
A censura, ela ama a arte
Mas é como a fera penteando a bela
A censura, ela morre de amor pela arte
Mas é a enxada
Acarinhando a fada
A censura, ela adora a fragrância da arte
Mas é o machado
Entre as flores do prado

Tom Zé


Giorgio De Chirico









Quando Eu Era Sem Ninguém



Ô cadê, cadê você?
Quando eu era sem ninguém
eu não tinha amor nenhum,
o meu coração batia, ô maninha,
tum, tum, tum.
Todo mundo arranja um bem:
eu ficando sem ninguém
e o meu coração batendo, ô maninha,
tum, tum, tum.
Você diz que faca corta,
que navalha corta mais,
e a navalha que mais corta
é a língua dos rapaz.
Tum, tum, tum, tindolelê.
tum, tum, tum, tindolalá.
As moças da minha terra
nunca ficam sem casar,
(porque se passar dos trinta ela tem
Santo Antônio pra ajudar).
E toda meia-noite
eu sonho com você.
se você duvidar, posso até
sonhar pra você ver.



Tom Zé

Giorgio De Chirico







Só (Solidão) 


Solidão...
Solidão...
Que poeira leve
Solidão
Olhe a casa é sua
O telefo...
Solidão
Que poeira leve
Solidão
Olhe a casa é sua
E no meu descompasso
O riso dela
Na vida quem perde o telhado
Em troca recebe as estrelas
Pra rimar até se afogar
E de soluço em soluço esperar
O sol que sobe na cama
E acende o lençol
Só lhe chamando
Solicitando
Solidão
Que poeira leve...
Se ela nascesse rainha
Se o mundo pudesse agüentar
Os pobres ela pisaria
E os ricos iria humilhar.
Milhares de guerras faria
Pra se deleitar
Por isso eu prefiro
Cantar sozinho...
Solidão
Que poeira leve
Solidão
Olhe a casa é sua
O telefone chamou, foi engano...
Solidão
Que poeira leve
Olhe a casa é sua
E no meu descompasso
Passo o riso dela
Solidão
Que poeira leve
Solidão
Olhe a casa é sua
O telefone chamou, foi engano...


Tom Zé


Giorgio De Chirico







Amar


Amar, amar
Ceder ao coração
A razão
E só, só, só viver
Pra ser
A casca pro outro
Viver.
E ter, e ter e ter....
Amarguras mil sem ter,
Por que e pra que tecer
E ser...
Como uma varinha de condão
Para quando riscar o chão
Espalhar, espalhar no céu (ah!)
Beatles a granel
Em sonhos de papel
Porque na vida amar é fel e mel
(bis)
Tudo bem alto,
Tudo baixinho,
Tudo calado
Tudo bem alto,
Tudo baixinho
Tudo..


Tom Zé


Giorgio De Chirico





Sofro de Juventude



Eu sofro de juventude

Essa coisa maldita,
Que quando tá quase pronta
Desmorona e se frita.
Negar a boca do pai
Para eu mesmo descobrir
Desesperar-me de medo
Perante cada segredo.
O meu pai, o diretor
E o doutor juiz,
Juiz, juiz
Me jogaram neste poço
E onde eu ouço
Ouço ouço ouço
Em doçuras e torturas
Em pleno gozo
Gozo
O urubu que no seu pouso
Me prepara e me separa
Do caroço
Osso osso osso
E me veste
Com a peste
Para a festa do colosso
Do colosso, do colosso, ô, ô.


Tom Zé

Giorgio De Chirico





Solidão



Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
Na vida, quem perde o telhado
Em troca recebe as estrelas
Pra rimar até se afogar
E de soluço em soluço esperar
O sol que sobe na cama
E acende o lençol
Só lhe chamando
Solicitando
Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
O telefone chamou
Foi engano
Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
E no meu descompasso o riso dela
Se ela nascesse rainha
Se o mundo pudesse aguentar
Os pobres ela pisaria
E os ricos iria humilhar
Milhares de guerras faria
Pra se deleitar
Por isso eu prefiro cantar sozinho
Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
O telefone chamou, foi engano
Solidão, que poeira leve
Solidão, olha a casa é sua
E no meu descompasso passo o riso dela
Solidão (solidão)


Tom Zé
 

Giorgio De Chirico








AMADO MICHAEL


Negro da luz que desbota branco
Tanto talento tormento tanto
Tanta afronta de pouca monta.
Eia! virtudes em farta ceia
Todo encanto que pode o canto
Toda fiança que adoça a dança.
Que deus nos furta vida tão curta?
Mundo lamenta: ele mal cinquenta!
A ninguém ilude essa bruxa rude.
Paroxismo desse Narciso
Que achou desgosto no próprio rosto
E apedrejou-se com faca e foice.
Avança a rua (uma dor que dança)
E em seus telhados mandibulados
Requebra os hinos do dançarino.
Niños, rapazes, se sentem azes
Herdeiros todos e seus parceiros
Revelam parque, porto e favela.

II
Da Grécia três te trouxeram Graças
Arcas repletas de belas artes
Arcas que deram ciúme às Parcas.
Que luz trarias tu, mitologia,
Para um tal desatino de destino
Que o espandongado toma por fado?
Porque o povo grego disse que
Se a hybris o herói consigo quis,
Se condiz ao lado dela ser feliz
Ele mesmo será pão e maldição
Enquanto gera para os olhos de Megera.


Tom Zé

Giorgio De Chirico







Vá Tomar



Meta sua grandeza
no banco da esquina,
vá tomar no verbo
seu filho da letra
meta sua usura
na multinacional
vá tomar na virgem
seu filho da cruz.
Meta sua moral,
regras e regulamentos
escritórios e gravatas
sua sessão solene.
Pegue e junte tudo
passe brilhantina
enfie, soque, meta
no tanque de gasolina.


Tom Zé  

Giorgio De Chirico











Tô bem de baixo prá poder subir
Tô bem de cima prá poder cair
Tô dividindo prá poder sobrar
Desperdiçando prá poder faltar
Devagarinho prá poder caber
Bem de leve prá não perdoar
Tô estudando prá saber ignorar
Eu tô aqui comendo para vomitar
Eu tô te explicando
Prá te confundir
Eu tô te confundindo
Prá te esclarecer
Tô iluminado
Prá poder cegar
Tô ficando cego
Prá poder guiar
Suavemente prá poder rasgar
Olho fechado prá te ver melhor
Com alegria prá poder chorar
Desesperado prá ter paciência
Carinhoso prá poder ferir
Lentamente prá não atrasar
Atrás da vida prá poder morrer
Eu tô me despedindo prá poder voltar


Tom Zé

Giorgio De Chirico







Urgente pela paz


Povo Perigo Padece
Povoa A Praça Depressa
De Pandeiros E Preces,
Urgente Pela Paz.
De Pé, O País Repudia
Vadia Guerra Que Adia
O Dia Azul Que Seria,
Urgente Pela Paz.
Os Poderosos Querem Guerrear
Mas Pra Lá Do Paquistão, Do Quixadã,
E Bem Alem Das Águas Do Jordão,
Pela Paz É Urgente, É Urjá,
Pela Paz É Urgente, É Urjá.
Repetição, Petição
Nos Quatro Cantos, Japão,
Daqui Até O Sudão,
Urgente Pela Paz.
Até No Baião Bato Pé,
Se Quer Pagode Ou Axé,
Pajé, No Taco Boto Fe,
Urgente Pela Paz.
Os Poderosos Querem Guerrear,
Mas Pra Lá Do Paquistão, Do Quixada,
E Bem Além Das Águas Do Jordao,
Pela Paz É Urgente, É Urjá,
Pela Paz É Urgente, É Urjá.


Tom Zé

Giorgio De Chirico


Giorgio De Chirico

Giorgio De Chirico nasceu em Volos, Grécia, em 1888. Morreu em Roma, Itália, em 1978. Estudou em Atenas. Foi para Munique em 1906, tendo recebido nessa época influências do romantismo de Böcklin e do simbolismo de Klinger. Entre 1911 e 1915 morou em Paris, onde entrou em contato com as vanguardas artísticas. Suas telas foram admiradas por Breton e Apollinaire. Durante a Primeira Guerra Mundial retornou à Itália. Nesse período, junto com Carrá e Morandi, introduziu idéias de uma pintura metafísica, que interrogavam dimensões do conhecimento, onde o vazio existencial se faz presente.

De Chirico teve bastante projeção dentro das correntes artísticas vigentes na época tendo contribuído, decisivamente, para o Surrealismo, proposto por Breton, em 1924.

Mais tarde, rompeu com esses movimentos e passou a pesquisar técnicas de pintura copiando, inclusive, quadros renascentistas.









 Todos Os Olhos


De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão,
esperando e querendo
que eu seja um herói,
que eu seja um herói.

Mas eu sou inocente,
eu sou inocente,
eu sou inocente.

De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando e querendo
que eu saiba.

Mas eu não sei de nada,
eu não sei de ná,
eu não sei de ná.

De vez em quando
todos os olhos se voltam pra mim,
de lá do fundo da escuridão
esperando e querendo apanhar,
querendo que eu bata,
querendo que eu seja um Deus.
Mas eu não tenho chicote,
eu não tenho chicó,
eu não tenho chicó.

Mas eu sou até fraco,
eu sou até frá,
eu sou até frá.


Tom Zé


Compositor, cantor, arranjador e ator nascido em Irará (BA), em 11 de outubro de 1936,Tom Zé é uma das figuras mais originais e controvertidas da MPB. Aprendeu a gostar de música ouvindo rádio em sua cidade natal a ponto de decidir estudar música na Universidade da Bahia, em Salvador. Lá teve aula com Koellreuter, Smetak e Ernst Widmer, e aprendeu harmonia, contraponto, composição, piano, violoncelo. No começo da década de 60 conheceu Gilberto Gil, Gal Costa, Caetano Veloso e Maria Bethânia, com quem montou um grupo para os espetáculos "Nós, Por Exemplo" e "Velha Bossa Nova e Nova Bossa Velha". Com esse grupo foi para São Paulo, onde participou do espetáculo "Arena Canta Bahia" e do disco-chave para o movimento tropicalista, "Tropicália ou Panis et Circensis", lançado pela Philips em 1968 e que continha sua composição "Parque Industrial". No mesmo ano conseguiu o primeiro lugar no Festival de MPB com "São São Paulo, Meu Amor" e apareceu seu primeiro LP individual, "Tom Zé", seguido por outros discos na década de 70. Seu álbum "Todos os Olhos", de 1973, foi considerado inovador demais, e não teve boa aceitação, afastando Tom Zé da mídia brasileira, a despeito do imenso sucesso de seus conterrâneos. Gravou outros discos de menos sucesso, como "Correio da Estação do Brás" (1978) e "Nave Maria" (1984). No fim da década de 80 sua carreira deu uma reviravolta quando o músico David Byrne descobriu num sebo o inovador "Estudando o Samba", LP em que Tom Zé (com parceiros como Elton Medeiros) mexe nas estruturas do principal gênero musical do país. Fascinado, Byrne lançou o compositor no mercado internacional por meio de seu recém-criado selo, Luaka Bop. O disco "The Best of Tom Zé", editado por Byrne em 1990 foi aclamado pela crítica, ficando entre os dez melhores da década em todo o mundo, na avaliação da revistas Rolling Stone. Excursionou pela Europa e Estados Unidos durante a década de 90, com bastante sucesso, o que só se refletiu no Brasil em 1999, com o lançamento de seu CD "Com Defeito de Fabricação" no Brasil. A partir daí Tom Zé voltou ao cenário da música brasileira. Entre suas músicas destacam-se "Mã", "Um 'Oh!' e um 'Ah!'", "Nave Maria", "Cademar" (com Augusto de Campos), "Xiquexique" (com José Miguel Wisnik).