Fase Livro by Sergio Niculitcheff





Livros

Caetano Veloso

Composição: Caetano Veloso

Tropeçavas nos astros desastrada
Quase não tínhamos livros em casa
E a cidade não tinha livraria
Mas os livros que em nossa vida entraram
São como a radiação de um corpo negro
Apontando pra a expansão do Universo
Porque a frase, o conceito, o enredo, o verso
(E, sem dúvida, sobretudo o verso)
É o que pode lançar mundos no mundo.


Tropeçavas nos astros desastrada
Sem saber que a ventura e a desventura
Dessa estrada que vai do nada ao nada
São livros e o luar contra a cultura.


Os livros são objetos transcendentes
Mas podemos amá-los do amor táctil
Que votamos aos maços de cigarro
Domá-los, cultivá-los em aquários,
Em estantes, gaiolas, em fogueiras
Ou lançá-los pra fora das janelas
(Talvez isso nos livre de lançarmo-nos)
Ou ­ o que é muito pior ­ por odiarmo-los
Podemos simplesmente escrever um:


Encher de vãs palavras muitas páginas
E de mais confusão as prateleiras.
Tropeçavas nos astros desastrada
Mas pra mim foste a estrela entre as estrelas.


Fase Livro by Sergio Niculitcheff




Amigo livro

Para Fada do Mar Suave


Adoeci, cansei...
Meus olhos estão abertos, mas não vejo
Respiro porque o ar é teimoso e invade os meus pulmões
As pernas desobedecem e ando assim mesmo
Uma espécie de culpa da vida está na nuvem negra sobre a minha cabeça
Ela não resolve o que quer
Não cai e teima em me perseguir
O cansaço aumenta a cada dia, hora, minuto...
Uma chama, contudo, ainda persiste.
Tateando lá vou eu...
Acelero um pouco mais e coloco o pé no freio.
Aliviado vou me aquietando quando chego a comer as primeiras letras de um livro
Pouco a pouco já não vejo a nuvem
Outros mundos invadem um mundo que desconheço
As letras vão forjando frases amigáveis que me abraçam sem pudor
De folha em folha, vou comendo devagar as páginas
O cansaço diminui e um fogo dá vida a uma nova fervura dentro de mim.




Lúcio Alves de Barros - Inverno de 2009

Fase Livro by Sergio Niculitcheff

Sergio Niculitcheff nasceu em 18 de fevereiro de 1960 em São Paulo, onde vive e trabalha com pintura.

Graduado em Artes Plásticas pela Faculdade de Belas Artes de São Paulo, em 1978. Concluiu mestrado na Universidade Estadual Paulista. Em 2003. Cursou doutorado no Instituto de Artes da UNICAMP.

Sua primeira exposição individual aconteceu no Museu Guido Viaro, em Curitiba, Brasil, em 1985.

Expôs seus trabalhos também em galerias de São Paulo e Belém do Pará, no Museu de Arte Contemporânea de Campinas, na Galeria Ruta Correa, em Friburg, na Alemanha, e no Paço das Artes, em São Paulo, Brasil.

. Entre 1981 e 1982, viaja para a Europa, principalmente França e Espanha,

participa de exposições e mantém contato com Leonilson (1957 - 1993) e Luiz Zerbini

(1959). Em Paris, é auxiliar do artista Piza (1928), na Galeria Bellechase. Posteriormente,

em São Paulo, leciona na Faculdade de Artes Alcântara Machado.

“(...) As pinturas de Niculitcheff

trabalham quase sempre com imagens-símbolos entendidas como blocos puros de sentido.

Como se o artista em suas telas estivesse fazendo o reconhecimento dos símbolos mais

persistentes na história do homem desde o passado até o presente, reinterpretando-os e

lançando-os ao devir dessa mesma história.”

(Tadeu Chiarelli)

nico@netpoint.com.br

Rua Helvetia 579 AP 64 Campos Elíseos - São Paulo SP CEP 01215 - 010 fone 3223- 8199








Rastros e Sinais



(somos presente
reminiscente
de quantas histórias
pessoais e colectivas?)



Leituras nas dobras do mundo.



De tudo que me é escolhido
por obra de estranho destino
resta-me persistir em palavras
no escuro.



Meus pertences,
que me são?
Tudo que tenho é continuar ...
decifrando,devorando
códigos, rastros e sinais.



oh deus! já te leio tanto,
o quê, quem,
(e se te existes?)
para quê?




De que me resta, então,
descabida procura?
Não encontro mais letras
tampouco versos
que combinem
apenas,
um insano desejo de continuar.




E renasço a cada dia
morta-viva,
meus interlocutores
ao longo da vida,
não me privam
jamais
de sustento, cimento
e de chão construído



( sedimentos guardados em argamassas de nós)



ler é flanar,
captar
em fôrma estranha,
sonhos reais...



(continuo a existir
sem o saber
nas páginas que não li...



De quantas vidas e histórias
me fizeram humana?)



Ana Paula Perissé*




“Meu primeiro contato com a obra de Sergio foi, naturalmente através da Fada, com as imagens de Santa Sabedoria e Santo Conhecimento. Confesso que fiquei impactada e mobilizada por elas.

Tenho especial carinho por Alfredo Manguel, que foi secretario do maravilhoso Borges, e publica livros deliciosos a respeito deste tema. Quando conheci as obras do Sergio( não arrisco seu sobrenome rsrsrs) estava lendo o Manguel...

Vou achar maravilhoso tentar me inspirar por estes caras e escrevinhar umas linhas que sairão do coração e da própria forma como me organizo como ser humano ... vai chegar uma hora que serei expulsa de minha casa pelas pilhas de livros que já não tem mais espaço nas estantes, e a angústia de não ter conseguido ler tudo que me propus, vivo assim.”

Ana Paula Perissé



Fase Livro by Sergio Niculitcheff




Desconstrução.




Meus livros tem passeado...
Vivem livres pela casa,
desarrumados,
livre trânsito no nada...
Às vezes perdidos,
se amontoam vários títulos,
que brincam de se esconder.
Dão risada do meu tempo,
que o perco viajando...
divagando no ser ou não ser...



Volto a eles,
os encontro no armário,
na cozinha, cestos no canto da sala,
no banheiro,
na poltrona de leitura,
prosa pura,
bate papo informal no casual.



Sem sossego, me chamando noite e dia
me provocam pra compor as poesias.



Mesmo sendo bagunçados,
de poeira até os olhos,
levo-os sempre para a cama
de mãos dadas, me adormece
em seu regaço...




Gaiô.