Margarida Cepêda







Tela

Esvaziei a minha tela
Joguei-te de encontro à parede.
Expulsei-te com teus demônios
A enredar-te em próprias teias.

Disfarcei, tremi, sofri.
Dei-te um fim.
Apartei-te de mim.

Lancei-te ao vento, em conjecturas mornas.
Bueiro adentro, junto às baratas mortas.
Execrei-te, bati, fervi.
Cozinhei em fogo brando, sem lavar.
Só cosi!!

Agora o inevitável - pesar
Junto às tuas lágrimas, teu penar.

Minha tela ficou livre, esvaziada, firme e forte.
Pregada, estampada, ajeitada,
Caprichada, imbatível, intocável,
Lavada, perfumada, impermeável.

Só figura o capricho
Sem tuas mãos, sem carrapichos
Tem odor, perfume e cor...
Tem laranja, ocre, sabor...
Sem a luz fingida e rubra,
Ondeando, tateando, beliscando.

É vazia, é Clarice, tem meiguice.
Olhos tristes trocados por faróis.
Enormes seios vertem leite
Gota a gota, fio a fio...
Afundaram o teu navio

Minha tela... é vazia..,.
Minha tela... todo dia...
É tão bela, arrepia!




Kátia Torres Negrisoli



Nenhum comentário: