I
As mãos invisíveis dedilham a canção sinistra
vibrando as fibras nervosas da medula
Os dentes mastigam o sem fim de peripaques nostálgicos
enquanto o mistério corre pela rua em chamas.
Aonde andará o poeta de pijama que escorrega e cai,
enquanto distraído sonha um mundo de estrelas?
Já não há céu, nem solo firme. Silencie-me! Silencie-me!
Sigo as labaredas memoráveis dos dias de luto e melancolia.
Quero a forma perfeita, o beijo, o cheiro do Apolo ruivo.
Sei da impossibilidade das horas, da complementaridade ilusória.
Olho o monte de esterco apodrecendo na vidraça entreaberta.
Janelas, penhascos, arranhásseis e corpos voadores de pedra.
Se a noite persegue minha vida, deposito monstros no aquário.
Os peixes caminham no asfalto e as mulheres usam gravatas.
Minha alma, meu desejo, minha imobilidade. Apenas eu!
Danço a quimera dos solitários e o presságio dos carecas.
Um poema, um segmento refratário. Não sei de mim.
As idéias são espasmos, e as palavras, coisa inútil.
Seria senil e insano se acreditasse no amanhã.
Vivo esse segundo que se arrasta, devorando-me.
Roberto Piva
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