Variações para o Rondó
Para minha avó Maria Carolina
De compostura conventual,
a avó que foi sinhá
e as avós da avó
sentam-se em longas mesas
cobertas de linho branco de delicados bordados.
Tão meninas e tão barrocas,
metidas em tantas roupas
sobrando nos sofás.
De velhas estórias que se guardam, ficaram as avós
como a lenda na lembrança,
deixando-se servir por negras de África,
em porcelanas de Inglaterra e França.
Porque de sins serviam a seus senhores.
Tão meninas e tão barrocas,
de estremeços maternais
viviam essas sinhás.
Para os folguedos não esquecidos
da quadra infantil,
nas grandes salas, valsas de piano ressoavam,
o riso, o choro de crianças
e os embalos das mucamas.
Essas meninas barrocas
lembravam suas bonecas
esquecidas nos sofás.
Tinham gestos breves das polcas e dos minuetos
deslizantes em salões de pinho de Riga - pés gracis;
e os falares intrigantes, embora de amor constante.
Nas cabeças inquietas, sonho que desatina.
O sorriso se escondia por trás de leques da China.
Tão meninas e tão barrocas,
de graça muita. alegria pouca,
suspiravam essas sinhás.
Tão românticas passaram em varandas patriarcais
de apuradas formas de ânforas, rosetas e flor de lis
e em lembranças se arrumaram
assim em retratos, de golas altas e cabelos em bandós,
ornatos de colares de ouro, e pedrarias,
tão infantas, Deus meu, mas tão matriarcais,
tão sós e tão serenas em suas estampas retocadas.
tão meninas e tão barrocas,
enfatuadas com tantas roupas,
rendando nos sofás,
que hoje para esta avó de avoengas sinhás
o meu beijo dirijo, assaz respeitoso,
neste século XX desgracioso,
sem dengues, sem leques,
sem doçuras de sinhás.
Ah! quem nos dera assim meninas tão barrocas,
vestidas naquelas mesmas roupas
arrumadas nos sofás!
Myriam Coeli
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