Richard S. Johnson
A física do susto
O espelho caiu da parede.
Caiu com ele o meu rosto.
Com o meu rosto a minha sede.
Com a minha sede eu desgosto.
O meu desgosto de olhar,
no espelho caído, o meu rosto.
Cassiano Ricardo
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A orquídea
A orquídea parece
uma flor viva, uma
boca, e nos assusta.
Flor aracnídea.
Vagamente humana,
boca, embora feita
de inocentes pétalas,
já supõe perfídia.
Já supõe palavra
embora muda
Já supõe insídia.
Que estará dizendo
o lábio quase humano
da orquídea?
Cassiano Ricardo
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Richard S. Johnson
A rua
Bem sei que, muitas vezes,
O único remédio
É adiar tudo. É adiar a
sede, a fome, a viagem,
A dívida, o divertimento,
O pedido de emprego, ou a
própria alegria.
A esperança é também uma
forma
De continuo adiamento.
Sei que é preciso
prestigiar a esperança,
Numa sala de espera.
Mas sei também que espera
significa luta e não, apenas,
Esperança sentada.
Não abdicação diante da
vida.
A esperança
Nunca é a forma burguesa,
sentada e tranquila da espera.
Nunca é figura de mulher
Do quadro antigo.
Sentada, dando milho aos
pombos.
Cassiano Ricardo
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Desejo
As coisas que não conseguem morrer
Só por isso são chamadas eternas.
As estrelas, dolorosas lanternas
Que não sabem o que é deixar de ser.
Ó força incognoscível que governas
O meu querer, como o meu não-querer.
Quisera estar entre as simples luzernas
Que morrem no primeiro entardecer.
Ser deus — e não as coisas mais ditosas
Quanto mais breves, como são as rosas
É não sonhar, é nada mais obter.
Ó alegria dourada de o não ser
Entre as coisas que são, e as nebulosas,
Que não conseguiu dormir nem morrer.
Cassiano Ricardo
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Richard S. Johnson
ODE PASTORIL
A paisagem é minha
só porque tenho olhos.
O pássaro é meu
só porque tenho ouvidos.
Amo com a mão as coisas
que o estar aqui me deu.
No universal verde,
sou meu ser, não sou eu.
Em meu léxico lírico
só existem duas palavras,
e uma é irmã da outra:
a manhã e o amanhã.
Sinto que o espaço é a vida
e que o tempo é a morte.
E ponho, entre uma e outra,
meu rebanho de estrelas.
Cassiano Ricardo
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Richard S. Johnson
Mas tudo passou tão depressa
Não consigo dormir agora.
Nunca o silêncio gritou tanto
Nas ruas da minha memória.
Como agarrar líquido o tempo
Que pelos vãos dos dedos flui?
Meu coração é hoje um pássaro
Pousado na árvore que eu fui.
Cassiano Ricardo
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Richard S. Johnson
Espaço lírico
Não amo o espaço que o meu corpo ocupa
Num jardim público, num estribo de bonde.
Mas o espaço que mora em mim, luz interior.
Um espaço que é meu como uma flor
Que me nasceu por dentro, entre paredes.
Nutrido à custa de secretas sedes.
Que é a forma? Não o simples adorno.
Não o corpo habitando o espaço, mas o espaço
Dentro do meu perfil, do meu contorno.
Que haja em mim um chão vivo em cada passo
(mesmo nas horas mais obscuras) para
Que eu possa amar a todas as criaturas.
Morte: retorno ao incriado. Espaço:
Virgindade do tempo em campo verde.
Cassiano Ricardo
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O Relógio
"Diante de coisa tão doida
Conservemo-nos serenos
Cada minuto da vida
Nunca é mais, é sempre menos
Ser é apenas uma face
Do não ser, e não do ser
Desde o instante em que se nasce
Já se começa a morrer."
Cassiano Ricardo
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Richard S. Johnson
Nascido em
Chicago de uma família de artistas, suas reminiscências mais remotas o ligam
aos livros de Charles Dana Gibson, N.C. Wyeth, e John Singer Sargent em tardes
chuvosas. Ainda na escola, ganhou uma bolsa do prestigioso Art Institute of
Chicago. Mais tarde, cursou a American Academy of Art e, depois de formado,
iniciou bem sucessida carreira como ilustrador.
Voltando
suas atenções para as artes plásticas após vencer uma competição da International
Artists Magazine, Rick foi convidado ao Japão, onde fez tanto sucesso que foi
convidado inúmeras outras vezes e desenvolveu uma base internacional de
clientes e colecionadores. Também conquistou vários prêmios nos Estados Unidos,
como o Award of Excellence, dos Oil Painters of America em 2003.
Talvez o
termo que melhor descreva seu trabalho seja “Intimidade Poética”. Suas
pinceladas firmes, o uso das cores e a delicada composição do corpo e
fisionomia humanos criam um trabalho em harmonia que se recusa a chamar a
atenção por si só por seu virtuosismo técnico, mas atraem o expectador para uma
conscientização de que dividem um momento sereno e contemplativo; que a luz
sobre os personagens também os acaricia.
A outra vida
Não espero outra vida, depois desta.
Se esta é má
Por que não bastará aos deuses, já,
A pena que sofri?
Se é boa a vida, deixará de o ser,
Repetida.
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