Arte e Poesia do Rio Grande do Norte (Erasmo Andrade)






Marinha



O mar, sacudido pela viração, desata seu canto. As rochas parecem mover-se palpitantes — pássaros de pedras — na solidão. Agita-lhes os braços esverdeados das ondas inquietas. Braços de ondas que se enroscam nas pedras e oferecem flores de espumas. O mar se movimenta em seu volume verde vivo. Canta e vive. Sacode-se em ondas e dança na tarde, numa ilimitada alegria de luz. Sacode-se, dança e vive. Palpitante de vida, trêmulo de músicas, o mar desliza na tarde numa tocante comunicação de beleza. Há pássaros, gritos de pássaros, trinados de pássaros em seu canto. Há maior que o canto, a solidão imensa desse mar que se arrasta numa inconseqüente alegria, numa inútil palpitação e numa incompreendida harmonia. O mar é o mistério. É a própria solidão.

As pedras caminham. Há uma procissão de rochas no silêncio da tarde. Elas caminham pelo mar, sem destino, caminham dia e noite, incansáveis, insofridas. Perdem-se sob uma nuvem de espumas, reaparecem escuras e desalentadas e caminham em sua resignação.

O mar apenas se importa com o canto. Porém, há outros motivos que se harmonizam com sua indecifrável beleza. Velas douradas que se incendeiam na luz do sol que envelhece. Peixes de dorso brilhante fazem cambalhotas, traçam elipses com seus corpos esguios e se aprofundam nas águas inconstantes. Búzios coloridos guardam vozes estranhas e toda uma vegetação palpita e se desenvolve no segredo dessas águas milenares...

“Sou guerreiro de flamejante espada
e pastor que defendeu com a carne
e o sangue das palavras
o redil ruminando a larva do poema.” (In A República, 20/ 10/ 1957)



Myriam Coeli


2 comentários:

Kátia Torres disse...

O mAr... tema apaixonante, instigante, indecifrável como a alma das nobres poetas... este texto é maravilhoso!
Quero conhecer mais sobre a autora.

Kátia

Denize Solange Cruz disse...

Belo texto. A página hoje impressionou-me, pela descoberta do que já é real.