Renato Guttuso









No olho da agulha


Tatuar silêncios como formigas.
Afogar os relógios
numa pálpebra.
Vestir o grito com a pele 
do escaravelho.
Torcer os músculos da face
em perplexidade.
Cruzar a via absurda
das unhas, desorientado,
obscuro, recurvado
sobre as nádegas. 
Saber que toda flor é ridícula,
e mesmo assim cultivar
o minério, 
a dor,
a surda epilepsia.
Esquecer o próprio nome,
e sovar a terra
até a exaustão.
(Fosse apenas uma canção de colheita,
você diria amor e outras
palavras fáceis.)
Com o riso estúpido do camelo,
viajar ao olho
da agulha,
labiríntico, insano,
acreditando que toda história é um ácido.
Depois cauterizar a ferida,
aceitar o reflexo, 
o simulacro,
lembrar-se 
da semente antes do pão.
Tayata gate gate 
paragate parasamgate 
boddhi soha.


Claudio Daniel

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